sexta-feira, 28 de junho de 2013

Presidente da Comissão de Transportes da Câmara rechaça CPI sobre ônibus

Sebastião Ferraz (PMDB) criticou os vereadores da base que apoiaram a iniciativa e disse que as investigações não servirão para nada


Com cartazes, manifestantes ocupam as galerias da Câmara dos Vereadores do Rio durante pedido de abertura da CPI dos Ônibus, na última terça-feira
Foto: Gabriel de Paiva/25-06-2013 / O Globo
Com cartazes, manifestantes ocupam as galerias da Câmara dos Vereadores do Rio durante pedido de abertura da CPI dos Ônibus, na última terça-feira Gabriel de Paiva/25-06-2013 / O Globo
RIO — No último dia de sessão na Câmara dos Vereadores do Rio antes do recesso de meio de ano, e com as galerias do plenário completamente vazias, o presidente da Comissão de Transportes da Casa, vereador Sebastião Ferraz (PMDB), da base do governo, deu as caras e se pronunciou contra a instauração da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), que, a partir de agosto, deve começar a investigar o sistema de ônibus da cidade. Em entrevista ao GLOBO, Ferraz criticou os vereadores da base que apoiaram a iniciativa e disse que as investigações não servirão para nada:
Isso é um aproveitamento do PSOL. Eles ficam incitando a população, dando prejuízo, essa quebração... Mas isso é normal, também fui jovem. Muitas das vezes eu caminhava direitinho, mas, dali a pouco, eu também saía para quebrar alguma coisa. Isso faz parte da juventude, da adrenalina do jovem.
Durante seu discurso em plenário, Ferraz chegou a parabenizar os colegas que não assinaram a CPI. Seu principal argumento foi o voto do conselheiro Antônio Carlos Flores de Moraes, do Tribunal de Contas do Município (TCM), anunciado anteontem, um dia depois de o vereador Eliomar Coelho (PSOL) conseguir 27 assinaturas para a instalação da comissão. O TCM arquivou o processo que investigava a suspeita de formação de cartel durante a licitação que, em 2010, concedeu o sistema de transporte rodoviário na capital a quatro consórcios cujos sócios se repetem em várias empresas.
— Dei parabéns aos que assinaram e aos que não assinaram. Aos que não assinaram porque tiveram a paciência de esperar a resposta do tribunal, que veio no dia seguinte. Mas também parabenizei os afoitos, que assinaram e fizeram com que a comissão saísse — tentou explicar o presidente da Comissão de Transportes.
Empresa de ônibus como doadora
Ferraz tem como base eleitoral a Zona Norte. Já foi administrador regional do Méier, cargo atualmente ocupado pelo filho André Ferraz. Nas eleições de 2012, teve 21.982 votos. Em 2006, quando tentou sem sucesso uma vaga na Alerj, teve como um dos doadores de campanha a empresa Guanabara Diesel, que faz parte do império da família do empresário Jacob Barata, que, por ter participação em várias empresas, é conhecido como ‘‘Rei do Ônibus”. No início do mês, Ferraz já havia causado polêmica em plenário ao dar seu ponto de vista de como é dura a rotina de quem trabalha nos coletivos. ‘‘Motorista de ônibus é um cidadão comum. Ele bebe, ele fuma, cheira, bate na mulher, tem três mulheres”, declarou.
Apesar de saber que a CPI contará com maioria do governo — provavelmente quatro dos cinco membros serão da base —, Eliomar Coelho garantiu estar confiante com os trabalhos da comissão. Ele espera que a pressão da população continue quando as investigações começarem em agosto.
— Se nós contarmos com a presença da população no ato da instalação e durante os trabalhos, como nas audiências públicas, teremos sucesso. Se houver um revide do povo a uma tentativa de cerceamento, vai mudar de figura — comentou Eliomar, que ainda adiantou o nome de um daqueles que pretende convocar para a CPI: — Vamos chamar o conselheiro Antônio Carlos Flores de Moraes, do TCM. Foi uma vergonha o que ele fez. Precisamos perguntar a ele por que tomou a decisão de arquivar o processo sem embasamento técnico.
O vereador Paulo Pinheiro (PSOL) revelou que ainda tem esperanças de reabrir as investigações do TCM em relação aos contratos dos consórcios que operam as linhas do Rio. A assessoria do vereador está preparando um pedido de reconsideração ao tribunal. Sobre as declarações do colega, Pinheiro disse que não poderiam ter sido mais infelizes.
— Independente da decisão do Tribunal de Contas, há muita coisa a ser investigada em relação às empresas de ônibus do Rio. Já vi muita CPI no Brasil que produziu resultados excepcionais, apesar de falarem que não daria em nada. Vamos investigar e esclarecer o que for preciso — disse Pinheiro.
Governo: ‘não há o que esconder’
O líder do governo na Câmara dos Vereadores, Luiz Guaraná (PMDB), disse que o prefeito Eduardo Paes nada tem a esconder em relação aos contratos com os consórcios. Segundo ele, a CPI só saiu porque pelo menos 13 vereadores da base do governo assinaram o requerimento de Eliomar. Ele acusou o colega de tirar proveito das manifestações:
— Os protestos são bonitos e servem de alerta para os políticos. Para mim, o que a CPI vai discutir já foi debatido e explicado na campanha eleitoral de 2010. O que acontece nesse momento é oportunismo partidário.
Para o cientista político Marcelo Simas, professor do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj/Universidade Candido Mendes), Ferraz é um exemplo regional de que o Brasil precisa de uma reforma política.
— O sistema atual permite a criação de nichos eleitorais. Os parlamentares passam a representar grupos em lugar da sociedade, o que permite que se manifestem na contramão da opinião pública. Os exemplos são inúmeros. Na política nacional, temos o presidente da Comissão de Direitos Humanos, Marcos Feliciano (PSC-SP) — disse Marcelo Simas.
O professor de Ciência Política da UFF Eurico Figueiredo ressaltou ser preocupante o fato de Ferraz não representar uma exceção na classe política:
— Os legislativos, sejam eles locais ou nacionais, têm que ouvir a vontade popular. Caso contrário, corremos o risco de termos uma grave crise institucional.
As declarações de Ferraz irritaram o integrante do Fórum de Lutas contra o Aumento das Passagens Tadeu Lemos, aluno de História e membro do Diretório Central de Estudantes (DCE) da UFRJ.
— Quem está na rua não são os desordeiros. O povo reivindica um transporte de qualidade. Queremos a CPI e que tudo seja investigado — disse Tadeu, que participou dos protestos de ontem no Centro contra a baixa qualidade de transportes da cidade.

Fonte: O Globo

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