sábado, 19 de janeiro de 2013

Hospital de Bonsucesso não opera desde dezembro

Em unidade, ocorrem 70% dos transplantes renais


Angústia. O aposentado Alfredo Pereira Duarte, que precisa de hemodiálise três vezes por semana enquanto não faz um transplante: ele espera pela operação há dois anos
Foto: Hudson Pontes / O Globo
Angústia. O aposentado Alfredo Pereira Duarte, que precisa de hemodiálise três vezes por semana enquanto não faz um transplante: ele espera pela operação há dois anosHudson Pontes / O Globo
RIO — A hemodiálise já faz parte da rotina do corretor de seguros aposentado Alfredo Pereira Duarte Filho, de 57 anos. Pelo menos três vezes por semana, durante quatro horas, ele precisa passar pelo procedimento. A angústia de Alfredo, que há dois anos espera por um transplante de rim de um doador morto, aumentou desde dezembro, quando esse tipo de cirurgia foi suspenso no Hospital Federal de Bonsucesso. A unidade, segundo associações de doentes renais, é responsável por 70% dos transplantes de rim no estado, que tem uma lista de 3.200 pacientes à espera de um órgão de doador morto.
De acordo com informações da Associação dos Renais e Transplantados do Estado do Rio (Adreterj), da Associação dos Movimentos dos Renais Vivos e Transplantados do Rio de Janeiro (Amorvit) e do Sindicato dos Médicos do Rio (SinMed-RJ), os transplantes foram suspensos devido à falta de cirurgiões vasculares no Hospital de Bonsucesso.
— A cada dia eu vejo que meu tempo de vida está sendo reduzido. Eu me preparei para fazer essa cirurgia, confiava nos médicos do hospital. Fico preocupado, porque a cirurgia de transplante no Hospital de Bonsucesso era de boa qualidade — desabafou Alfredo.
Morador de Niterói, ele sofre com problemas renais desde a adolescência. No ano 2000, Alfredo fez um transplante no próprio Hospital de Bonsucesso e recebeu um terceiro rim. Esse órgão, no entanto, também apresentou problemas. Atualmente, o aposentado tem três rins que não funcionam e espera pela cirurgia na mesma unidade onde já foi operado.
Caso será denunciado ao MP
Segundo Gílson Nascimento da Silva, presidente da Adreterj, além dos transplantes com órgãos de doadores já mortos, há 12 famílias de doentes que estão prontas para a cirurgia entre vivos (quando um parente doa um dos rins) no Hospital de Bonsucesso.
Em média, entre operações com órgãos doados por pessoas vivas e mortas, a unidade costuma fazer oito transplantes mensais. Os hospitais universitários Clementino Fraga Filho (UFRJ), no Fundão, Pedro Ernesto (Uerj), em Vila Isabel, e Antônio Pedro (UFF), em Niterói, também fazem transplantes renais. Essa cirurgia é realizada ainda no Hospital Silvestre, no Cosme Velho, uma unidade filantrópica.
— O procedimento para entrar na lista é demorado. O paciente precisa fazer uma série de exames, entre eles os de sangue e de imagens. Fazer esses exames na rede pública de saúde pode levar de cinco a seis meses. Como demora tanto tempo, eles podem ter suas datas de validade vencidas — disse Gilson, informando que a associação vai denunciar à Procuradoria Geral da República no Rio a suspensão dos transplantes no Hospital de Bonsucesso.
De acordo com a Adreterj, os transplantes para doentes que esperam por órgãos de doadores mortos foram suspensos no dia 8 de dezembro. E no caso dos que esperam por órgãos de vivos, no dia 15 do mesmo mês.
Problema constatado em outubro
O presidente da Amorvit, Roque Pereira, também está preocupado com a situação.
— A preocupação é com os exames dos pacientes que já estão prontos. Essa situação é absurda. A direção do hospital (de Bonsucesso) deve uma justificativa à sociedade — protestou Roque, informando que a associação organiza para os próximos dias uma passeata em frente ao hospital.
Segundo o diretor jurídico do SinMed-RJ, Júlio Noronha, a falta de equipes cirúrgicas já tinha sido constatada em outubro do ano passado. Em memorando à direção do hospital — e ao qual o sindicato teve acesso —, a chefia da clínica de cirurgia vascular informou, no dia 16 daquele mês, que não havia médicos lotados nos plantões de sexta-feira, sábado e domingo. Com isso, os plantonistas trabalhavam de segunda a quinta-feira. “Acreditamos que o programa não pode continuar sem equipes cirúrgicas todos os dias”, alertou o memorando.
— Essa suspensão é um crime contra a saúde da população. Os transplantes renais no Hospital Federal de Bonsucesso ocorriam há 31 anos sem interrupção. Vamos cobrar explicações do Ministério da Saúde — disse Noronha.
O defensor público Daniel Macedo informou que vai enviar ofícios à direção do Hospital de Bonsucesso e ao Ministério da Saúde, também cobrando explicações. Caso a situação seja comprovada, será ajuizada uma ação civil pública, pedindo a convocação imediata de profissionais aprovados em concurso público. A ideia é, no caso de a determinação não ser cumprida, pedir uma multa diária de R$ 100 mil.
— É lamentável que um hospital que é unidade de referência histórica no transplante renal não possa mais prestar esse serviço. Estamos mais uma vez vendo um órgão federal fechar as portas ao paciente. Se as cirurgias são suspensas, alguém dessa fila pode até morrer — avaliou o defensor.
Mais recursos para o Rio
Por meio de nota, o Ministério da Saúde informou ontem que “vem tomando medidas para recompor a força de trabalho das equipes de transplantes renais do Hospital Federal de Bonsucesso”. O órgão afirmou ainda que coordena o Sistema Nacional de Transplantes e financia a realização de transplantes em todo o país. Nos últimos três anos (de 2010 a 2012), segundo a nota, o ministério repassou mais de R$ 11 milhões ao Estado do Rio para transplantes renais. Esse montante representou um crescimento de 149% dos recursos transferidos pelo governo federal, permitindo ao estado aumentar em 34% o número de pessoas operadas no período.


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Fonte: O Globo

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