terça-feira, 19 de março de 2013

Especialistas: temporal que atinge Petrópolis tem potencial destruidor

Em 24h, choveu mais do que em todo o mês de março de 2012


Inundação. Uma das praças que ficaram alagadas em Petrópolis: dois rios transbordaram e deixaram vários pontos da cidade debaixo d’água
Foto: Pablo Jacob / O Globo
Inundação. Uma das praças que ficaram alagadas em Petrópolis: dois rios transbordaram e deixaram vários pontos da cidade debaixo d’águaPablo Jacob / O Globo
RIO — A tempestade que se abateu sobre a cidade de Petrópolis desde a tarde de domingo veio carregada com um potencial destruidor, segundo especialistas em clima ouvidos pelo GLOBO, pela sua intensidade num espaço curto de tempo. Dados do Sistema de Alerta contra Cheias do Instituto Estadual do Ambiente (Inea) mostram que somente no Quitandinha, uma das 19 estações pluviométricas e hidrológicas instaladas naquele município, o acumulado de chuvas chegou a bater 453,8 milímetros às 14h15m de ontem, um somatório das 24 horas anteriores. A força fora do comum, contudo, não poderia ainda ser creditada a mudanças climáticas globais e nem deveria ser encarada com a vilã dos deslizamentos e transbordamentos de rios, segundo os mesmos especialistas. Eles apontam a falta de planejamento urbano, a ocupação das escostas e margens de rios e a deposição de lixo e esgoto em canais fluviais como catalizadores da tragédia, num período do ano em que as chuvas intensas são muito comuns.
Por volta das 16h30m de segunda-feira, o acumulado na estação do Quitandinha já tinha baixado para 428,2 milímetros de chuva. Outras cinco estações da cidade registravam índices acumulados acima dos 300 milímetros em 24 horas nesse mesmo horário. Para se ter uma dimensão do temporal, em todo o mês de março do ano passado, choveu 300 milímetros na estação do Quintandinha. Em 2012, a estação que registrou maior volume de chuvas em todo mês de março na Região Serrana foi a da localidade de Morin, também em Petrópolis, com 429 milímetros. A série histórica do Inea na área é recente, uma vez que o sistema de alerta, criado em 2007 a partir da Baixada Fluminense, foi expandido para a serra após a tragédia de janeiro de 2011.
Já os dados do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), que tem estações em pontos diferentes do Inea, foram 147,5 milímetros de chuva em 24 horas na estação do Pico do Couto, que fica a 1.777 metros de altitude. A precipitação é a quarta maior da cidade, segundo a série histórica do InMet. O maior acúmulo de chuva em 24 horas registrado em estações na cidade imperial teria ocorrido em agosto de 1952, com 168,2 milímetros. Em novembro de 1965, foram 162,8 milímetros em 24 horas. E o terceiro maior acúmulo teria acontecido em março de 1930, com 154,2 milímetros de chuva. De acordo com a meteorologista do InMet, Marlene Leal, pelos dados do instituto, o local onde mais choveu ontem foi na estação do parque de Teresópolis, onde foi registrado 226,8 milímetros de chuva em 24 horas. A segunda pior chuva registrada nessa estação, perdendo apenas para uma tempestade de abril de 2011, quando o indice chegou a 245 milímetros.
Para a pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Chou Sin Chan, uma chuva superior a 400 milímetros em 24 horas pode ser classificada como extrema, capaz de provocar desastres até mesmo em cidades sem muitos problemas de planejamento urbano. Ressaltando que não contava com a série histórica de chuvas da região para uma análise mais pormenorizada, Chan contemporizou que cada cidade reage de forma diferente a uma quantidade determinada de chuva. Ela complementou que ainda não seria possível associar a tempestade na Região Serrana a eventuais mudanças do clima global, uma vez que seriam necessários dados consolidados sobre chuvas num longo período de tempo.
— Um índice de 400 milímetros em muito para um dia. Nenhuma cidade, mesmo que tirada do zero, é planejada para uma chuva dessas. Mas para saber se esse evento já seria uma tendência, é preciso ter um conjunto consistente de casos para analisar o futuro — explicou.
Para o professor do Departamento de Engenharia Sanitária e de Meio AMbiente da Uerj, Adacto Otoni, chuvas intensas nesta época do ano são uma característica do clima do estado do Rio, que tem em sua geografia, espremida entre a montanha e o mar, um catalizador para a formação de tempestades. Ele considera que a ocupação irregular de encostas e beiras de rios e o despejo irregular de lixo e esgoto nos canais pluviais concorrem sensivelmente para deslizamentos de terra e transbordamentos de rios.
— A principal responsável pelas tragédias que assistimos não são as chuvas, mas a degradação das bacias dos rios, que estão assoreados pela terra, lixo e esgoto que descem das montanhas.
A análise é compartilhada pelo professor e geógrafo Marcelo Motta, coordenador da pós graduação em Gestão Ambiental da PUC-Rio. Segundo o especialista, uma chuva como a de domingo em Petrópolis, que foge da curva estatística, é comum na história do estado do Rio.
— Botar tudo na conta de São Pedro é muito conveniente para as administrações municipais.
Outras tragédias
2003. 15 mortes na Região Metropolitana
2004. 13, sendo 11 na capital
2005. Seis em todo o estado
2006. 24, sendo 13 no Grande Rio.
2007. 31 em todo o estado.
2008. 18, sendo nove em Itaipava.
2009. Pelo menos seis em Teresópolis e municípios da Baixada Fluminense.
2010. Mais de 440. No Morro do Bumba, em Niterói, foram 47 mortos.
2011. Pelo menos 920 na Região Serrana. Na época, cerca de 200 pessoas foram dadas como desaparecidas.
2012 . 25, sendo 22 em Sapucaia.

Fonte: O Globo

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