terça-feira, 22 de maio de 2012

iG fala com autor da última entrevista de John Lennon e Yoko Ono


O americano David Sheff lança livro em que detalha as conversas com o Beatle e sua mulher
Foto: DivulgaçãoLennon e Yoko Ono, no apartamento do edifício Dakota, em Nova York
Setembro de 1980. O americano David Sheff, um então jovem jornalista de apenas 24 anos, recebe a incumbência de entrevistar o mais célebre casal da arte pop ocidental: John Lennon e Yoko Ono.
O que Sheff não sabia é que suas pouco mais de vinte horas de gravações de entrevistas se tornariam o último relato de intimidade do ex-Beatle. Lennon morreu no dia 8 de dezembro, dois dias depois da entrevista ser publicada na Playboy americana. A íntegra do papo – realizado tanto no lendário edifício Dakota, em Nova York, como em estúdios e nos escritórios do casal – foi lançada em livro.
A primeira edição foi publicada nos Estados Unidos em 1982, intitulada "A entrevista da Playboy com John Lennon & Yoko Ono: O testamento final". Em 2000 uma nova edição foi lançada, com um novo prefácio. Mas permaneceu inédita no Brasil até agora, com o lançamento de “A última entrevista do casal John Lennon e Yoko Ono” (ed. Nova Fronteira).
De São Francisco, Califórnia, Sheff conversou com a reportagem do iG. Entre as curiosidades, o autor conta que só foi recebido por Lennon após consulta de seu mapa astral. Ele recorda que, no amplo apartamento do cantor, havia um sarcófago e inúmeras peças de arte. Tão envolvente quando a entrevista em si são as recordações que Sheff traz à tona dos dias que passou com o mítico casal.
Foto: ReproduçãoPreço de capa: R$ 39,90
iG: Como surgiu a oportunidade de entrevistar John Lennon e Yoko Ono?
DAVID SHEFF:
Antes preciso contar como cheguei na Playboy. Já havia escrito para várias revistas, como Rolling Stones, People, entre outras. Mas ainda não tinha publicado nada na Playboy. Enviei dezenas de artigos e ideias para o editor, mas ele nunca respondeu.. Estava visitando Nova York, moro em São Francisco, e decidi perseguir o cara mais uma vez. Sabe-se lá por que, quando liguei, ele concordou em me ver. Pediu desculpas por não responder antes, e me deu uma atribuição. John Belushi e Dan Aykroyd estavam fazendo o filme “Blues Brothers” e fui designado para entrevistá-los. Quando saí do escritório, o editor perguntou: “Por falar nisso, você acha que é capaz de chegar a John Lennon e Yoko Ono?”.
iG: E o que você respondeu?
DAVID SHEFF:
Não tinha ideia de como chegar a eles, mas disse que podia entrevistar, sim. Ninguém ouvia falar deles já por um longo tempo. Saí do escritório e comecei a tentar chegar a John e Yoko de todas as formas, o que na época parecia impossível. Escrevi cartas, fiz telefonemas e persegui todas as pistas que pude para tentar encontrá-los. Nada. Mas numa certa manhã, um homem ligou e disse que estava trabalhando para Yoko Ono.
iG: Foi quando lhe pediram seu mapa astral?
DAVID SHEFF:
Isso. Ele perguntou quando e onde eu nasci. Respondi e ele desligou. Não fazia sentido, e por isso eu não esperava nada mais. No entanto, no dia seguinte o telefone tocou. Yoko no telefone! Baseado em minhas cartas astrológicas e numerológicas, fui aprovado, pelo menos para conhecê-la. Conforme as instruções, voei para Nova York e fui para o prédio Dakota, onde conheci Yoko pela primeira vez. A entrevista começou na manhã seguinte, na casa deles.
iG: O que mais o impressionou naquela casa?
DAVID SHEFF:
O apartamento era enorme e surpreendentemente bonito. Lembro que havia quadros de Andy Warhol do tamanho da parede pendurados no saguão de entrada. Um sarcófago envolto em vidro estava no meio da sala de estar. Pelos cantos, havia exemplos de peças de arte de Yoko. Tudo no quarto era branco, a janela dava para o Central Park West. Tudo, tudo branco puro. Sofá, tapete, lâmpadas, esculturas e o famoso piano em que Lennon compôs "Imagine".
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iG: Você escreve no livro que John Lennon o recebeu na porta cantando. Como foi a recepção?
DAVID SHEFF
: John cantarolou algo da melodia de "Eleanor Rigby". Falou algo como "Aqui está David Sheff! Venha fazer perguntas para obter respostas que ninguém mais vai ouvir”. Ele foi gentil e encantador.
iG: Quem gostava mais de papo: John Lennon ou Yoko Ono?
DAVID SHEFF:
Yoko era protetora de John, mas ela não era antipática durante nossos encontros. Era engraçada, brincava com John o tempo todo, ele ria e brincava com ela... Me pareceu que havia ali muito carinho. Rapidamente entendi aquele relacionamento.
iG: Muitos acusam Yoko de querer Lennon só para ela...
DAVID SHEFF:
Yoko era incrivelmente sábia. John dizia que queria que as pessoas soubessem que Yoko era sua professora, e ele o estudante. Ao longo dos anos fiquei amigo dela e entendi o lado de Yoko que a maioria das pessoas não vê. Ela era incrivelmente interessante, amiga calorosa e fiel.
iG: Segundo seu livro, as últimas palavras registradas na entrevista foram: “Quem sabe o que vai acontecer?”. O que ele queria dizer com isso?
DAVID SHEFF:
Nós estávamos falando sobre o título de seu novo álbum, “Double Fantasy”. John disse: “Este pode não ser o título...”. E completou: “Alguma coisa pode mudar. Mudamos o tempo todo. Posso estar agora num novo estúdio ou no meio do oceano. Quem sabe o que vai acontecer?” Estas foram suas últimas palavras gravadas nas fitas da entrevista.
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iG: Como foi seu último encontro com John Lennon?
DAVID SHEFF:
Eu o encontrei para a última sessão de entrevista no dia 28 de setembro de 1980 e, depois disso, falei com ele uma vez mais por telefone.
iG: Deu tempo de ele ler a publicação antes de morrer?
DAVID SHEFF:
Sim. No dia 7 de dezembro Yoko me ligou dizendo que estava muito satisfeita com a entrevista, publicada no dia anterior. Ela disse que John também estava satisfeito e animado. No dia seguinte, John foi embora.
iG: Você ainda se emociona ao lembrar daquele dia?
DAVID SHEFF:
É tão triste... Sempre que penso em John, quando ouço uma música, quando me lembro de estar com ele no chão de mármore do escritório de Yoko ou no estúdio de gravação, quando eu penso em sua família deixada para trás...
iG: No fim da contas, quem era John Lennon?
DAVID SHEFF:
Ele era um artista que se revelou puro e um homem que levava uma mensagem de paz, a paz mundial e a paz pessoal. E ainda assim foi brutalmente assassinado. Ele disse que nunca saberia conviver com isso, com o fato de pacifistas morrerem violentamente. Acho que eu também não posso.
Foto: DivulgaçãoDavid Sheff
Fonte: Valmir Moratelli, iG Rio de Janeiro

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