quarta-feira, 24 de agosto de 2016

Está na hora de o brasileiro assumir a sua vira-latice


Rio, 2016. Cidade e ano que marcarão para sempre um momento único do esporte, a primeira Olimpíada na América do Sul. Um evento aberto com uma das cerimônias mais espetaculares e coloridas da história dos Jogos, dirigida e executada por brasileiros – em sua grande maioria, voluntários.
Ao longo de duas semanas de competição, nos estádios, nos ginásios, pistas, areias, raias e piscinas, com algumas exceções – algumas delas bem doídas, é verdade ­– nossos atletas, imprensa, gestores e torcedores deram mostras de que estão à altura de qualquer evento no mundo.
Mas lidar com nossos complexos não foi fácil, especialmente, quando fomos confrontados diretamente por eles. Como resposta padrão, a expressão mais vista nas redes sociais foi “complexo de vira-lata”.
Cunhada pelo escritor e dramaturgo Nelson Rodrigues, a expressão se refere ao trauma de 1950, quando a Seleção Brasileira foi derrotada pela Seleção Uruguaia na final da Copa do Mundo, em pleno Maracanã – sessenta e seis anos atrás.
Para Rodrigues, mago das palavras e reacionário agudo, o “complexo de vira-lata” também se estendia à inferioridade em que o brasileiro se colocava, voluntariamente, em face do resto do mundo:
“O brasileiro é um narciso às avessas, que cospe na própria imagem. Eis a verdade: não encontramos pretextos pessoais ou históricos para a autoestima”
Será mesmo?
Será que quase 70 anos depois, com 5 Copas do Mundo na conta, agora uma medalha Olímpica, um Brasil que, apesar da crise, é reconhecido mundialmente como uma potência em desenvolvimento, que acaba de receber 208 nações em uma só cidade (com todos os problemas que já conhecemos) e dar um baile nos mentirosos nadadores americanos, apesar de ter uma Justiça e imprensa que funcionam, de ser uma nação que passou por traumas severos na política e na economia, ainda se coloca dessa forma perante o mundo?
Ou o complexo reside apenas na mente dos complexados?
Hora de mudar
Está na hora de inverter esse jogo, de contrariar Nelson Rodrigues, talvez o maior dos complexados, e aceitar a nossa vira-latice ou, em outras palavras,aceitar a nossa genuinidade.
Aceitar que o milênio é outro, que não ter raça definida, credo ou bandeira pode ser tão ou mais nobre do que pertencer a grandes potências – e a Delegação de Refugiados da Rio 2016 foi prova disso.
Motivos não faltam.
Fortes e resistentes, os Sem Raça Definida, como são chamados os vira-latas em suas carteirinhas de vacinação, passaram por uma seleção natural ao longo das décadas e dos séculos.
Versáteis, se adaptam a qualquer ambiente, espaço ou situação porque foram criados debaixo de chuva, do sol, no frio, no calor, na poeira, na areia ou na montanha.
Para completar, e a mágica reside aqui, nunca um vira-lata será igual a outro. São todos diferentes e complementares. São todos e não são nenhum. Valorizam a vida e são seguros porque sabem que, em pé de igualdade com muitos cães de raça por aí – alguns deles verdadeiros clones uns dos outros – podem até sair atrás, mas não raro chegam na frente.
Ser brasileiro é isso. Ser único no mundo, com defeitos e virtudes, pegando o melhor de cada raça, de cada credo, de cada cor, de cada cultura e se orgulhar desse caldo verde e amarelo. Mas também é aceitar que há melhores, sim, em determinados assuntos. E que, sim, temos muito a resolver.
Antes, portanto, de gritar por aí que alguém tem “complexo de vira-lata”, pense bem se você não está tentando se convencer de que tem um pedigree.
Quer maior complexo do que esse?
Fonte: Linkedin/ 
Sócio-diretor na Tawil Comunicação

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