No quarto trecho da entrevista exclusiva concedida ao 247, a presidente Dilma Rousseff sinaliza seu possível apoio à tese de novas eleições; segundo ela, rompeu-se o pacto político das forças que garantiram a redemocratização do País; "O que significa isso? Muito dificilmente haverá uma repactuação por cima. Isso traz a necessidade de uma nova repactuação via eleições diretas, pelo voto"; ela também falou sobre a questão tributária e política externa; "em vez de criar a CPMF, preferem que o pobre e o aposentado paguem o pato"; sobre o Itamaraty, comandado por José Serra, que só foi visitado pelo chanceler paraguaio, ela afirma que o mundo terá uma relação fria e distante com o Brasil, enquanto a democracia plena não for restabelecida no País; em relação a Eduardo Cunha, ela afirmou que qualquer acordo com ele teria sido "rendição"
Em sua entrevista exclusiva ao 247, a presidente eleita Dilma Rousseff afirmou que a volta da democracia no Brasil passa por seu retorno ao poder, mas revelou que será necessária uma nova repactuação pelo voto. "Foi rompido o pacto político que garantiu a redemocratização do Brasil", diz ela. "E não haverá uma repactuação por cima. Será necessária uma repactuação pela via da eleição direta".
Em trechos anteriores da entrevista, ela falou sobre temas como o desejo do presidente interino de calar a divergência, a sua disposição de rever os desmandos do governo interino, e a importância de programas sociais como o Mais Médicos. Neste quarto trecho do depoimento concedido aos jornalistas Leonardo Attuch, Tereza Cruvinel e Paulo Moreira Leite, ela também aborda a questão tributária e a política externa brasileira. Confira:
247 – Como a senhora avalia a questão fiscal e a necessidade de elevação de impostos?
Dilma Rousseff – Quando a economia cresce, não há conflito distributivo. Todos ganham. O conflito distributivo surge em períodos de retração, como o atual. E aqui no Brasil tem uma coisa sintomática. Dizem que não se pode aumentar imposto. Ora, por que não se pode pagar imposto?
247 – É a questão de pagar o pato?
Dilma – Sim, aqui o pato deve ser pago pelo pobre, pelo aposentado. Pelo menos na visão deste governo interino. Eu pergunto para vocês o seguinte: por que não fazem a CPMF? Ela atinge proporcionalmente quem faz mais transações financeiras. Ela não atinge as contas de salário. Ela não atinge as contas previdenciárias. Elas são isentas. Além disso, ela permite o controle das transações financeiras e, com isso, impede um grau de sonegação. Também não permitem os juros sobre o capital próprio e nem o imposto sobre lucros e dividendos. É uma outra jabuticaba brasileira. Somos o único país que possivelmente pode entrar na OCDE que não tributa lucros e dividendos.
247 – O Brasil é um país de empresa pobre e empresário rico?
Dilma – Exatamente. Lá fora, é empresa rica e empresário num padrão normal de riqueza. Como se diz lá em Minas, quando alguém se alça de pato a ganso, se fosse lá fora, a situação não mudaria muito. Poderia até complicar.
247 – E a política externa? O presidente interino não recebeu telefonemas e o chanceler não foi recebido por praticamente ninguém. O Brasil será um pária internacional?
Dilma – Acontecerá muito provavelmente com o Brasil o que aconteceu com o Paraguai. A relação será fria e distante. No dia em que for feita uma eleição nacional, as coisas mudam de figura. Mas não estou falando de presidente "eleito" por impeachment ou por eleição indireta. Tem que ser eleito pelo voto. No Paraguai, mesmo depois da eleição a relação continuou fria por um tempo. Enquanto não houver um governo legítimo, o mundo terá muita cautela com o Brasil. É assim que funciona.
247 – Essa sua fala significa que a senhora já defende novas eleições?
Dilma – Eu sempre fui a favor de eleições. Se não, fica parecendo que eu era a favor de ditadura e não de eleições. A solução democrática passa pela minha volta. Mas num segundo momento, vamos ter que discutir: o que rompeu no Brasil? Nós rompemos o pacto político que sustentou o Brasil desde a Constituição de 1988. As forças políticas que se uniram naquele momento tiveram uma ruptura. Aquele dia 17 de abril foi um momento de ruptura. O que significa isso? Muito dificilmente haverá uma repactuação por cima. Isso traz a necessidade de uma nova repactuação via eleições diretas, pelo voto.
247 – Não é possível haver diálogo?
Dilma – É muito difícil sentar numa mesa e dialogar na situação como a de hoje. Você acha que o presidente interino e seus aliados que usurparam o poder sairão por bem? O fato é que a saída passa pela minha volta. Depois são outros quinhentos.
247 – Antes de novas eleições, não deve haver uma outra discussão sobre um novo modelo de governabilidade? Porque do jeito que está, com o presidencialismo de coalizão, ou para muitos de extorsão do Executivo pelo Legislativo, não funciona.
Dilma – Vou te contar uma pergunta que me fizeram. Será que não teria sido melhor apoiar o Eduardo Cunha? O que que acontece? Acontece o seguinte. Como era o pacto antes? O Fernando Henrique com sua aliança ou nós, com nossa aliança com o centro político, tínhamos como garantir a sustentabilidade ao País. No entanto, mais recentemente surgiu, dentro do PMDB, uma força com convicções próprias, ultraliberais em economia, conservadoras nos costumes, e com pauta própria. Qual é essa pauta do governo Temer?
247 – A senhora falava de Cunha ou Temer? Ou os dois são a mesma coisa?
Dilma – Nas gravações de Romero Jucá, além da questão de estancar essa sangria, ele também disse outra coisa importante: 'Temer é Cunha'. O Jucá diz e repete isso. O Eduardo Cunha controla 55% dos votos na Câmara. E sua pauta está expressa no conservadorismo de todo o governo Temer. E não tem negociação querido. A maioria do governo Temer é do Cunha. O fato de ser presidente provisório dá algum poder ao Temer. Mas as linhas gerais são do Cunha. No meu caso, um acordo com ele seria rendição. Só faz acordo com ele quem abre mão de suas convicções. Veja o caso dos Estados Unidos. O Obama não tem maioria nem na Câmara nem no Senado. E enfrenta a turma barra-pesada do Tea Party. Mas ninguém cobra que ele abra mão de suas convicções e de sua pauta.
247 – Qual é a sua posição sobre o parlamentarismo?
Dilma – No Brasil, a política mais progressista sempre se deu nas relações com o governo federal. Depois da República Velha, com a chegada do nosso querido Getúlio Vargas, todas as modificações progressistas, até a estruturação do Estado nacional, se deram em políticas de regimes presidencialistas. Porém, ao mesmo tempo, quando você olha a questão do parlamento, sem fulanizar, os filtros econômicos, oligárquicos e de interesses puxam um perfil mais conservador do que o das forças que chegam à presidência.
247 – Basta dizer que o Fernando Henrique foi presidente e teve 20% do parlamento. O Lula teve 18%. A senhora teve 16% das cadeiras. Todos dependeram desse centrão.
Dilma – Eu diria que o grande retrocesso que pode sair desse processo, se eles continuarem e eu não voltar, é o reforço da tendência ao parlamentarismo. Quando eu digo que é fundamental para a democracia que eu volte, um dos motivos é que eu jamais compactuarei com o parlamentarismo ou com o semiparlamentarismo.
247 – Ok, mas como um presidente vai formar maiorias depois de um fenômeno como a Lava Jato que implodiu as relações entre Executivo e Legislativo? Porque manter o presidencialismo e sujeitá-lo às extorsões parlamentares também não faz muito sentido.
Dilma – Quem sabe não teremos um Congresso melhor depois de uma reforma política? Eu digo e repito. Nós não sairemos dessa crise se não fizermos uma reforma política.
247 – A senhora fala em volta. Mas que força teria para governar?
Dilma – A força da volta. Estou tentando ganhar votos com diálogo e persuasão sobre a natureza do golpe. Mas cada passo de uma vez.
Os próximos trechos da entrevista exclusiva da presidente Dilma Rousseff serão publicados nesta sexta-feira. Ela também será publicada integralmente na Revista Brasil 24/7 no Flipboard.
Fonte: 247
Nenhum comentário:
Postar um comentário