Ministério da Saúde será alvo de processo por suspender transplante de rins e fígado
>> Transplantes são suspensos e homem perde rim depois de atraso no atendimento no HGB
"O hospital foi paralisado de forma grotesca, o que jamais poderia ter acontecido tamanha a relevância do serviço prestado no HGB. O que se faz no HGB hoje é uma carnificina, um homicídio. Outras unidades que também realizam transplantes vão ficar sobrecaregadas", disparou o defensor.
O Hospital Geral de Bonsucesso é o único em todo o estado que realiza transplante de rins e de fígado em crianças. A unidade conta com cerca de 1 mil dos 1600 pacientes que estão na fila por um transplante em todo o estado, incluindo adultos e crianças.
O grupo de 14 médicos que deixou a unidade - incluindo dois coordenadores de transplante- vai trabalhar no Centro de Transplante do governo do estado, cuja inauguração está prevista para o dia 18 deste mês no Hospital São Francisco de Assis, na Tijuca.
O defensor público classificou ainda como "omissão" do Ministério da Saúde a não reposição de médicos que pediram demissão ou se aposentaram nos últimos anos. "A estrutura física não é desculpa. Ou o Ministério da Saúde contrata mais médicos ou faz novo concurso público", afirmou o defensor.
Depois da vistoria, Macedo decidiu ajuizar o Ministério da Saúde. Certo de que a DPU deve enfrentar uma batalha judicial para garantir o atendimento de pelo menos 1 mil doentes crônicos, ele acredita que liminares durante o trâmite do processo podem garantir o transplante dos pacientes na rede privada pagos pelo Sistema Único de Saúde.
"Enquanto a ação é ajuizada, o SUS pode ser obrigado por liminares a pagar o tratamento dos pacientes na rede privada. O que não pode é a população ficar sem transplante e sem atendimento", destacou o defensor.
Uma manifestação foi feita na entrada do hospital na manhã desta quarta-feira (6) pedindo a volta dos transplantes. Conforme o
A suspensão atingiu diretamente 18 dos 1600 pacientes que aguardam na fila por um novo órgão. O pequeno grupo - menos de 1% dos necessitados - vivia a expectativa da cirurgia no início de 2013 o que o livraria das sessões de hemodiálise. Nada foi comunicado a estes pacientes pela administração do hospital. A informação corre apenas pelos corredores do HGB.
O auxiliar de produção Reginaldo Silva Corrêa, 30 anos, teve um rim completamente comprometido depois da demora no atendimento no Hospital de Bonsucesso. Ele foi submetido a uma cirurgia para a retirada de cálculos renais no final de 2011. Depois disso, já no início do ano passado, teve um catéter instalado em seu corpo - responsável por ligar o rim à bexiga.
De acordo com nefrologistas, o tempo máximo que um paciente deve ficar com um catéter deste tipo é de três meses. No entanto, com a greve na unidade no ano passado, Reginaldo teve sua cirurgia desmarcada duas vezes. Há um mês, quando retornou à unidade de saúde, descobriu que seu rim esquerdo não funciona mais. Ele credita aos problemas do hospital o prejuízo da sua saúde:
"Quando o médico me disse que o meu rim esquerdo não funcionava mais, fiquei desesperado. Porque eu estava fazendo tratamento para a retirada dos cálculos renais. Eu jamais poderia estar um ano com um catéter, sem atendimento. Os problemas do hospital prejudicam ainda mais a saúde dos pacientes. Se eu tivesse sido atendido mais rapidamente poderia ter me livrado destes problemas de rins. O hospital precisa de mais médicos o quanto antes", pede o paciente.
Transplante é adiado pela terceira vez
O cortador de couro Luiz Fernando Santos, 52 anos, teve seu transplante de rins adiado pela terceira vez. Depois de dois anos de diálise, a descoberta de um doador compatível era para ser um acontecimento alegre, não fosse a falta de médicos da unidade que impede o transplante. A primeira cirurgia foi marcada para o início de dezembro do ano passado. Para a surpresa do paciente, ela acabou adiada por duas vezes por falta de profissionais. A maior carência, segundo funcionários da unidade, é por anestesistas e cirurgiões vasculares.
"Eu já tenho um doador de rim e não aguento mais esperar a data de uma nova cirurgia. Já desmarcaram comigo três vezes. Eu tenho direito de ter uma vida normal. A diálise é angustiante, não aguento mais. A cada sessão, me sinto pior. Não tenho disposição para nada e sinto um forte enjôo e cansaço. Quero uma vida nova o quanto antes. Para isso, preciso ser transplantado", reclama o morador de Belford Roxo, na Baixada Fluminense. Ele aguarda a quarta marcação de sua cirurgia.
Rede pública não acompanha captação
Enquanto a doação de órgãos cresce no Rio - saltou de quatro para 15 doadores por milhão de habitantes - a rede pública parece andar na contramão do avanço. Os 3,8 milhões repassados anualmente pelo Ministério à unidade de saúde parecem insuficientes para atender às necessidades. Hoje o Rio de Janeiro tem uma necessidade de 1600 transplantes. A maior parte trata-se de casos de doentes renais - 1100.
Como aponta o vice-presidente da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos, Lucio Pacheco, o orçamento limitado do HGB e a falta de médicos impossibilitam as cirurgias. Pacheco é ex-coordenador do Transplante de Fígado do hospital federal.
"Muitos médicos se aposentam e não são repostos pelo Ministério da Saúde. Além disso, os salários fora da rede pública são muito convidativos. Os profissionais encontram empregos onde conseguem ganhar o dobro do salário oferecido pelo Ministério", explica Pacheco. "Também há grande déficit de anestesistas. Não havia estrutura no HGB para continuar os transplantes. O que aconteceu foi que chegamos no nosso limite. Por isso, acabou. Chegamos no limite do amadorismo. O Rio precisa de uma política de transplantes mais eficiente, como já acontece em Porto Alegre e São Paulo".
Conforme revela o médico, o principal entrave para a realização de transplantes é que há um impedimento legal para pagar por fora a um profissional cuja especialidade esteja em falta na unidade de saúde.
"É ilegal que o hospital custeie a contratação de profissionais que esteja em falta para compor a equipe e evitar que a cirurgia seja desmarcada. Já tivemos problemas com o Ministério Público por conta disso e não há o que fazer. A lei existe para ser cumprida. O atual modelo de gestão deste e de outros hospitais é engessado".
A solução, para o ex-coordenador de transplante de fígado do HGB, é seguir o modelo já adotado pela Santa Casa de Porto Alegre e pelo Hospital do Rim e Hipertensão - o maior centro de transplantes do mundo. Os dois maiores pólos de transplantes do Brasil trabalham com Organizações Sociais (OSs), o que permite o pagamento dos profissionais por produtividade. Isto é, por cirurgia realizada.
Fonte: Jornal do Brasil
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